Matéria escrita pela Fair Price em outubro / 2020
É comum que um processo judicial envolva diferentes temas no decorrer da discussão e, a depender da complexidade, uns são resolvidos mais rápidos que outros. Para conferir maior celeridade na resolução dos casos com temas múltiplos, o juiz pode optar pelo fracionamento da execução. Assim, os temas que já têm sentença definitiva dentro do processo podem gerar o ofício requisitório de pagamento – o precatório ou RPV/OPV –, a depender do valor. Na linguagem jurídica é o que se chama de expedição de precatório da parcela ou parte incontroversa, ou seja, a fatia do processo que foi transitada em julgado.
Ocorre que a Fazenda Pública vem há algum tempo se manifestando contra o fracionamento da execução. Para tanto, sustenta o argumento no art. 100, §8º da Constituição Federal:
“§8º – É vedada a expedição de precatórios complementares ou suplementares de valor pago, bem como o fracionamento, repartição ou quebra do valor da execução para fins de enquadramento de parcela do total ao que dispõe o § 3º deste artigo”.
A discussão tomou proporções em grande escala, e o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a pauta como sendo de repercussão geral. O assunto foi abordado no Tema 28, e teve como relator o ministro Marco Aurélio.
A repercussão geral foi reconhecida no Recurso Extraordinário (RE) 1205530 interposto pelo Departamento de Estradas e Rodagens de São Paulo (DER-SP), em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça Estadual de São Paulo (TJE-SP), que ratificou a sentença e autorizou o prosseguimento da execução em relação à parte incontroversa. A autarquia estadual sustentou que a Constituição Federal proíbe a expedição de requisitório para quitação de quantia incontroversa sem trânsito em julgado de toda a decisão. Segundo o DER, a execução da parcela incontroversa caracterizaria o fracionamento de precatório e violaria à ordem cronológica de pagamento.
Nesse sentido, o relator fez entender em seu voto que o fracionamento da execução quanto às partes controversa e incontroversa não viola o art. 100 e seus respectivos parágrafos da Constituição Federal. O tema já havia sido tratado por ambas as turmas do STF.
O ministro destacou ainda que o tema está pacificado na esfera federal, conforme enunciado n. 31 da Advocacia-Geral da União que traz a seguinte redação: “É cabível a expedição de precatório referente a parcela incontroversa, em sede de execução ajuizada em face da Fazenda Pública”.
Vale mencionar que, no voto, o relator argumenta que “é desarrazoado impedir a busca da satisfação imediata da parte do título judicial não mais passível de ser alterada, colocando-se na mesma vala daquela que continua sob o exame do Judiciário”.
Por fim, foi dado parcial provimento ao Recurso Extraordinário onde permitiu-se o fracionamento da execução por meio da liberação de valores incontroversos, firmando-se a seguinte tese:
“Surge constitucional expedição de precatório ou requisição de pequeno valor para pagamento da parte incontroversa e autônoma do pronunciamento judicial transitada em julgado observada a importância total executada para efeitos de dimensionamento como obrigação de pequeno valor”.
A decisão transitou em julgado em 19 de agosto deste ano, e está sendo bem recebida pelos órgãos do Judiciário e pela comunidade jurídica como um todo. O entendimento fixado auxilia na liberação de processos que permaneceram sobrestados, facilita o recebimento dos valores devidos, e pode fomentar o mercado de compra de direitos creditórios, que tem agora como possibilidade a compra os valores incontroversos antes da expedição dos precatórios.