A PEC dos Precatórios e o cabo de guerra político

Matéria escrita pela Fair Price em outubro / 2021

Desde que foi anunciada, ainda na sua primeira versão, a PEC dos precatórios tornou-se um dos assuntos mais polêmicos da atualidade no campo da política nacional. Com o país em estado de calamidade, inflação em alta, taxa de desemprego crescente e uma economia fragilizada, restou à atual gestão crescer os olhos para os bilhões de reais devidos em precatórios. 

Às vésperas do ano de eleição, a equipe econômica do governo viu nos precatórios o problema e, ao mesmo tempo, a solução. Ao se deparar com a assombrosa cifra de quase R$ 90 bilhões de reais a serem pagos no ano que vem, o governo se apressou em dizer que não tem como pagar sem comprometer as finanças públicas. Como apelação, o ministério da Economia fez diversas declarações equivocadas, e ameaçou furar o teto de gastos caso tenha que arcar com as dívidas e o planejamento orçamentário para o próximo ano, que inclui o tão falado Auxílio Brasil.

Fato é que os R$ 89 bi previstos na Lei Orçamentária Anual não serão pagos caso a PEC dos Precatórios seja aprovada. O novo texto propõe um teto anual de até R$ 39 bi para gastos com execuções judiciais, e traz a possibilidade de pagamento antecipado com deságio de 40%. Isso fará com que os precatórios que ultrapassarem o limite do teto sejam postergados para os anos seguintes, aumentando o bolo da dívida federal.

Se a PEC passar, com o espaço liberado no orçamento, a União pretende viabilizar o programa de transferência de renda que vai substituir o Bolsa Família, e que é a aposta do governo para a reeleição. Acontece que o tema virou um cabo de guerra político entre os apoiadores do governo e a oposição. E nessa guerra, credores e o próprio mercado ficam de fora.

O adiamento da votação

Na semana passada, a proposta de emenda constitucional foi aprovada pela comissão especial da Câmara dos Deputados, que excluiu alguns pontos do texto e inseriu outros, como o limite para pagamento de precatórios, a nova aferição para o teto de gastos, e o pagamento com desconto. O novo texto deveria ter sido votado na terça, foi adiado para quarta, e deve ir ao Plenário somente na semana que vem.

O adiamento foi causado pela oposição, que contesta a constitucionalidade da proposta, alegando que a medida vai institucionalizar o calote. Fora do campo político, especialistas da área econômica alertam para o perigo da mudança no teto de gastos em pleno cenário de inflação crescente. Afirmam que tanto essa medida quanto o não pagamento das dívidas judiciais transmitem um ar de insegurança para o mercado externo e interno. Vale lembrar que, até então, a União detém a fama de ser a única devedora que paga em dia seus precatórios.

Em contrapartida, a ala favorável ao texto vem apelando ao Congresso para que a PEC seja aprovada o mais rápido possível. A PEC está em análise na Câmara e, caso passe adiante, terá que ser votada também no Senado. Em entrevista realizada essa semana, o ministro da Cidadania, João Roma, pediu a aprovação da proposta o “quanto antes” pois, caso contrário, o governo terá “dificuldades operacionais” para fazer os pagamentos. 

Segundo o ministro, “nós estamos sensibilizando o parlamento para que seja o quanto antes […] O nosso apelo é para que até a segunda semana de novembro essa medida possa ser aprovada, porque, senão, terá dificuldades operacionais, inclusive para fazer chegar o recurso a essa população”.

Os pagamentos a que Roma se refere são do Auxílio Brasil, que deve ter um valor mínimo de R$ 400 reais. O programa precisa ser implementado ainda esse ano, uma vez que em ano eleitoral não é permitida a implantação de medidas assistenciais de longo prazo. Daí a urgência, e o crescente clima de tensão dentro do Palácio.

Como ficam os credores?

Se os planos do governo se concretizarem, estima-se que as mudanças da PEC liberem quase R$ 84 bilhões para despesas no ano que vem, incluindo o novo auxílio. Acontece que, dentro dessa discussão, os credores de precatórios sequer são considerados. Como já falamos por aqui anteriormente, os donos desses créditos são pessoas que já passaram pelo lento e angustiante processo judicial, e tiveram a sua indenização fixada em sentença. Só falta receberem o valor devido. 

E, conforme exposto na LOA 2022, a maior parte desses precatórios provém de ações de revisão de aposentadorias, benefícios previdenciários e pensões. Ou seja: são precatórios que dizem respeito à sobrevivência destes cidadãos. Constatar que o Estado desconsidera essa parcela da população, e entende esse dinheiro como seu, e não como uma dívida para os credores, revela um problema grave de gestão das contas públicas.

É claro que, em face da atual situação sócio econômica, é urgente que se estabeleça uma política de transferência de renda forte que possa atender aos milhões de brasileiros desassistidos. Contudo, especialistas apontam para possibilidades mais sustentáveis a longo prazo para a manutenção do Bolsa Família, ou do novo programa proposto pelo governo. Contar com o dinheiro dos precatórios só irá jogar para debaixo do tapete a questão da dívida pública, aumentando ainda mais a frustração dos credores e a insegurança do mercado.

Diante de tais proposições que são claramente políticas, e não administrativas, resta saber qual lado do cabo de guerra irá levar a melhor. Enquanto isso, ficam em modo de espera milhares de credores e investidores, aguardando a resolução que pode alterar drasticamente seus planos de vida futuros.

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